por Kívia Mota Nascimento, sexta, 25 de Maio de 2012 às 11:46 ·
Caro ilustríssimo sr. Ministro,
Ouvi
 sobre a sua ignorância dos motivos de nossa greve nacional, e me senti 
compelido a esclarecê-lo (vício da profissão de professor, eu suponho). 
Peço desculpas se o meu português é ruim ou se a sequência das ideias é 
falha, mas esse é o meu valor. Se eu fosse mais capaz, estaria em uma 
profissão que me valorizasse mais. Seria ascensorista no Senado, por 
exemplo (ah, que sonho!). Como diria um vendedor de carros que eu 
conheço, ”quem mandou estudar, agora aguente”.
Falo de 
boca cheia, o sr. diria. Argumentaria que recebo muito mais do que a 
grande maioria da população brasileira, e eu lhe responderia que são 
poucos os cargos federais que pagam menos do que o magistério, que 
existem cargos de nível médio no executivo federal que pagam melhor do 
que os professores doutores recebem. E que o professor é importante para
 o crescimento da nação (aprendi isso no debate da Dilma candidata - 
pareceu que ela realmente dá muito valor ao magistério. Votei nela).
Mas
 magistério é um sacerdócio, não é mesmo? É uma profissão feita de 
abnegação. O que mais explicaria um médico desistir de clinicar para 
receber o salário de professor federal? Bom, talvez se ele fosse um 
médico excepcionalmente ruim, daí o salário de professor federal 
compensasse. Então ele poderia ser um bom professor.
O 
grande motivo da nossa greve, sr. Ministro, é a busca por valorização 
profissional. Tenho vários colegas professores cujo sonho de vida, hoje,
 é passarem em concurso para o MCT, ou para o Judiciário, e eu, quem sou
 eu? Para mim, economicamente falando, me bastaria o emprego de 
ascensorista no Senado.
O sr. tem filhos, sr. Ministro? 
Netos, talvez? Almeja uma educação com qualidade para eles? O sr. sonha 
com uma sociedade educada? Culta? Sonha com o Brasil se destacando no 
mundo como o Japão fez depois da Segunda Guerra? Como a Coréia hoje?
O
 sr. sabe quais são as minhas condições de trabalho, sr. Ministro? Sabe 
que eu sequer tenho uma mesa para colocar a minha pasta quando eu entro 
para dar aulas? Sabe que eu, há dois anos, comprei um projetor para dar 
aulas? Que nós rasgamos as calças ao sentar nas carteiras, por causa dos
 pregos? Que o computador pessoal que eu uso para dar aulas também saiu 
do salário que deveria ir para a minha família? Sabe que na minha 
universidade não existe nenhuma calçada para as pessoas andarem?
O
 sr. imagina qual é a situação dos laboratórios dos cursos em que eu 
ministro aulas, que são cursos tradicionais, reconhecidos nacionalmente,
 e que não foram contemplados pelo Reuni? É, são ruins. Não são 
péssimos, sabe o por quê? Porque os professores, por mérito pessoal e 
muito trabalho, trazem recursos de pesquisa para dentro dos laboratórios
 (caramba, isso é desvio de recursos! Dá cadeia?).
O sr. 
sabe, é claro, que o perfil desejável do Professor Universitário Federal
 é que ele seja doutor, com dedicação exclusiva (é impedido de fazer 
bicos para completar o salário), pesquisador, orientador e 
extensionista, e que além das aulas de graduação, forme Mestres e 
Doutores. Qual é o perfil do profissional que o sr. precisa para 
executar essa missão? Eu lhe digo. Esse profissional, economicamente 
falando, é alguém que não teve a competência para achar nada melhor para
 fazer com a sua vida. É alguém que não foi capaz de passar em um 
concurso para ascensorista do Senado. É alguém que não conseguiu ser 
agente de saúde quando terminou o segundo grau, por exemplo.
Sim,
 eu “tenho” carro e eu “tenho” casa. Eu me alimento bem. Meu carro é 
velho (tem seis anos) e ainda vou demorar dois anos para acabar de 
pagar. Minha casa é velha também e eu ainda vou levar treze anos para 
pagar. Essas dívidas consomem quase 50% da minha renda familiar. Tenho 
que pensar antes de decidir sair para almoçar em um restaurante. E o 
pequeno detalhe é que tanto eu como a minha esposa somos professores 
universitários federais e doutores com dedicação exclusiva. Topo da 
carreira.
Bom, mas eu tenho uma perspectiva, não é? De 
progredir na carreira e melhorar meu salário? Perspectiva? não, não 
tenho. Não vejo nenhum futuro promissor. Essa carreira que o governo me 
oferece não irá melhorar a minha vida, a não ser um pouco, no momento 
mágico da progressão em que eu me tornar professor associado, ou com a 
utopia de passar pra professor titular (a minha universidade não tem 
nenhum. Teve uma vez, nos meus 22 anos de funcionalismo federal em 
universidades, que eu conheci pessoalmente um Titular. Deve ser mais 
fácil achar um jacaré no Tietê).
Eu espero, apesar das 
minhas deficiências, que o sr. tenha entendido um pouco do porque eu e 
45 universidades federais brasileiras estamos em greve. Desculpe-me se 
eu não posso elaborar mais, mas tenho um relatório de pesquisa para 
terminar e alunos de doutorado para atender, apesar da greve. Se eu 
achar tempo, também preciso ver se abriu vaga para ascensorista.
Um grande abraço, sr. Ministro, e obrigado por tudo.Jeferson Dombroski
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